sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Carta de uma professora da Unitau sobre a Ocupação do Pinheirinho #solidariedade

Sou assistente social e professora do curso de Serviço Social da Universidade de Taubaté. Até o ano de 2010 o conhecimento que eu tinha sobre a Ocupação do Pinheiro era pautado em informações da mídia, de literaturas específicas e por meio de uma amiga - também professora da UNITAU - que, além de sua relação próxima com tal Ocupação, desenvolveu em 2009 uma pesquisa de mestrado na PUC-SP sobre essa realidade.

Moradora do Pinheirinho carregando sua filha
(foto: Lucas Lacaz Ruiz/A13)
No entanto, no ano de 2011 tudo mudou... O meu olhar e a minha análise sobre a Ocupação do Pinheirinho ganharam novos contornos, pois tive a oportunidade de orientar um Trabalho de Conclusão de Curso de uma aluna que discutiu o significado da moradia para as famílias dessa Ocupação. Esse trabalho levou-me, a desenvolver uma reflexão teórica mais aprofundada sobre a realidade das Ocupações no Brasil, na qual, necessariamente, a questão da Reforma Agrária, das políticas habitacionais e das contradições existentes na sociedade capitalista foram centrais.

Dos diversos depoimentos das famílias que constam nesse Trabalho de Conclusão de Curso elegi um para fazer uma breve reflexão com o leitor. Este que aparece na epígrafe deste texto: “Pra mim a moradia depois da vida é a segunda vida. Como que você vai ter uma vida se não tiver uma moradia?”.

Convido-os a um ensaio do conhecido “processo de empatia”. O movimento de empatia é um exercício cotidiano muitas vezes de difícil objetivação, porque requer que nos coloquemos no lugar do outro, que nos transportemos para o seu mundo, ainda que esse mundo esteja distante de nós. Digo nós, os trabalhadores em geral, que apesar das dificuldades do dia-a-dia conseguem ter ou pagar suas moradias.

Agora pensemos o contrário: e os milhares de trabalhadores espalhados em território nacional que não têm acesso a sua casa própria? E não têm acesso não porque querem, ou porque são bandidos, preguiçosos... Não têm acesso porque lhes faltam estudo, emprego digno, renda. Porque faltam políticas que cumpram os princípios legais que regem a Carta Magna deste País; a Lei Maior que condensa a vida da nação e estabelece os deveres e direitos dos homens e das mulheres.

Área do Pinheirinho em 2004: terreno abandonado
(foto Manuel Pereira)
A Constituição Federal de 1988 trata da função social da propriedade e da desapropriação por interesse social.  Lembremo-nos que a área do Pinheirinho ficou abandonada por 30 anos, sem cumprir qualquer função social. Quando os moradores chegaram ao local, só havia mato e terra seca. Isso significa que a Ocupação não foi ilegal como muitos pensam. Além disso, são muitos os imbróglios que envolvem a aquisição dessa terra por parte de Naji Nahas, criminoso condenado por corrupção, lavagem de dinheiro e famoso por aplicar fraudes milionárias. Estima-se que ele deve mais de R$ 15 milhões de impostos à Prefeitura de São José dos Campos e também à União. Essa é a pessoa que se proclama “dono” da terra na qual que vivem hoje mais de duas mil famílias, o que implica em aproximadamente nove mil homens, mulheres, jovens, adolescentes e crianças. Pessoas que se não estivessem nesse local estariam nas ruas, em albergues, em aluguéis sociais provisórios, em filas intermináveis de programas habitacionais ou então a margem da sorte, do destino ou do interesse político.

Com a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, o direito à moradia adequada tornou-se universal, consentido em todo o mundo como um dos direitos fundamentais para a vida das pessoas. Sublinha-se moradia adequada, mas é válido lembrar que o cotidiano de vida da população do Pinheirinho é atravessado por inúmeros problemas, desde a não regularização de água e energia elétrica, como a inserção dessa população em trabalhos precários e tantos outros. O conhecimento in loco e a conversa com os moradores confirmam essa realidade!

Diante de tudo isso pergunto: a vida vale mais que o lucro ou não? O que acham?

Hoje, ao sairmos dos nossos locais de trabalho e chegarmos à nossa moradia encontraremos segurança, descanso, comida, chuveiro... Encontraremos nossos familiares, nossos amores e também nossos desafios. Encontraremos enfim, nossa vida. Nossa segunda vida.


Lindamar Alves Faermann é assistente social, mestre em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e doutoranda em Serviço Social pela mesma Instituição, professora do curso de Serviço Social da Universidade de Taubaté (Unitau)

2 comentários:

  1. Estou de total acordo sobre a necessidade de moradia e direito que as pessoas possuem mas questiono o caminho da invasão. Se ao invés de trazer essas pessoas à SJC e incentivar a ocupação do Pinheirinho o Movimento tivesse ocupado uma Camara Municipal ou um Congresso Nacional não surtiria um efeito melhor forçando com que a legislação fosse alterada de maneira atender com maior agilidade as necessidades da sociedade ?

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  2. Quem vai morar em prédio público? Quem invadiu alguma coisa aqui foram os portugueses e espanhois que mataram todos os indios que encontraram pela frente. Vc deveria questionar sua consciência e parar de ver a globo.
    Que tal vir aqui p/ o chão organizar e organizar-se ao invés de posar do alto dessa pseudointelectualidade verborragica.

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